domingo, 11 de agosto de 2013

Dois mundos : em busca de valores e referências

Pedro Simon
O que se assiste, nestes nossos turbulentos dias, é uma cruel e perversa banalização da vida. Perderam-se, na ventania da barbárie, os nossos melhores valores e referências de vida, cultivados durante gerações inteiras. A televisão substituiu a família, a escola e a igreja, não apenas na melhor informação, mas, principalmente, na formação do caráter, principalmente dos mais jovens. O círculo familiar da troca de idéias, por exemplo, deu lugar ao semicírculo do silêncio, cortado pela voz do locutor, ou do ator. A vida, nem mesmo, imita a ficção. É substituída por ela.

A questão central, quando se analisa o papel da televisão na formação da sociedade é se o noticiário reiterado da violência não geraria efeitos multiplicadores da barbárie.
Ou seja, se é a notícia que municia as novelas, tão pobres das melhores referências, ou se ocorre, exatamente, o contrário.


O escritor Sílvio de Abreu atribui a inversão de valores presente nas novelas, legitimada pelas pesquisas qualitativas, aos escândalos e à falta de ética na política que, no caso, nada têm de ficção. Ao contrário, tem sido prática cada vez mais constante na realidade brasileira e, conseqüentemente, no noticiário do dia-a-dia. Para o autor, portanto, é o noticiário que municia, e legitima o enredo.

Nunca, em qualquer outro momento da nossa história política, a corrupção campeou, com tamanha desenvoltura, nos corredores do poder. Todos os segmentos da Administração Pública viraram notícia. Transferiram-se dos cadernos de política para as páginas policiais. Receberam, nas operações da Polícia Federal, nomes dos mais criativos. Mas, é, ainda, um segmento que tem condições financeiras para contratar os melhores advogados. Para estes, a justiça descansa. Do outro lado do muro, uma imensa maioria, que mal sabe o que é justiça, mas que conhece, muito bem, a polícia.

Há, portanto, um verdadeiro muro da vergonha que divide o mundo entre incluídos e excluídos. De um lado, a grife, a opulência. De outro, a fome, a miséria. O consumismo se transformou num verdadeiro fundamentalismo religioso imposto pelas escrituras da globalização. Daí, a busca de valores e referências perdidos nestes tempos de barbárie e de desvios éticos do comportamento humano. Um resgate do melhor conceito de humanidade. E, quem sabe, de felicidade.

É por isso que temas como família, escola, igreja, mídia, ética, valores, referências, legitimidade institucional, reforma política, desobediência civil, violência, barbárie, fome, miséria, entre outros afins, são tão reiterados, nas reflexões aqui publicadas. Tenho repetido que as mudanças que o país tanto reclama deverão emergir da sociedade civil, de fora para dentro das instituições públicas que, pilares da democracia, apresentam, hoje, baixíssimos índices de legitimidade. Para que essa esperança coletiva se torne realidade, há que se ocupar, de novo, as ruas e as praças deste País, através da sociedade civil organizada, em manifestações pacíficas, como nos momentos históricos das Diretas-Já e dos Caras-Pintadas. O País não pode conviver, mais, com tamanha barbárie e corrupção, que corroem os pilares da democracia brasileira.

O Brasil perdeu, nos tempos recentes, nomes referenciais como Dom Ivo Lorscheiter, Dom Helder Câmara, Barbosa Lima Sobrinho, Teotônio Vilela, Tancredo Neves, Darcy Ribeiro, Raimundo Faoro, Evandro Lins e Silva, Sobral Pinto, Celso Furtado, entre tantos outros. Ficaram, entretanto, os seus exemplos e ensinamentos. São homens que não se contentaram em viver a história do País. Fizeram-na.

Todos esses exemplos e ensinamentos são fundamentais para que possamos conceber um projeto de país verdadeiramente nacional. Não há como continuar convivendo com milhões de excluídos, numa terra que mais se parece uma síntese da Criação. Não se quer, evidentemente, o fim do supérfluo, mas a distribuição democrática do necessário.

Espero que a leitura desta publicação, extraída dos meus principais pronunciamentos no plenário do Senado Federal e de palestras em universidades e instituições representativas da sociedade civil, vá muito além da sua mera tiragem.

Como instrumento de discussão em busca da realização dos melhores sonhos por um país moldado pela dignidade, pela ética, pela democracia, pela soberania e pela cidadania, ela não pode dormitar nas prateleiras frias do esquecimento.

Senador PEDRO SIMON
Dois mundos: em busca de valores e referências / Pedro Simon. – Brasília :

Senado Federal, 2007.

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